No Brasil, as academias criadas no século XVIII foram inspiradas nas portuguesas, contudo, desde o início, houve um grande interesse na construção da história regional e futura história nacional (PALMA-FERREIRA, 1982), fato que as transformou em importantes redutos de difusão de conhecimento. Três academias se destacaram: a Academia Brasílica dos Esquecidos, a Academia Brasílica dos Renascidos e a Academia Científica do Rio de Janeiro.
Fundada em Salvador em 1724 e extinta em 1725, a Academia Brasílica dos Esquecidos era dedicada fundamentalmente à construção de uma história da América Portuguesa, e dela participaram expoentes como Alexandre de Gusmão, Luís da Gama e Sebastião da Rocha Pitta (KANTOR, 2004). A Academia Brasílica dos Renascidos foi fundada em 1759, também em Salvador, uma restauração da Academia Brasílica dos Esquecidos, agora protegida pelo Marquês de Pombal, sendo o seu maior projeto escrever a história filosófica do Brasil (RIBEIRO, s.d.). Para ela foram convocados os antigos membros da Academia dos Esquecidos, e teve mais de 100 colaboradores, que formavam uma grande rede de informantes composta por comerciantes, militares, burocratas e clérigos.
Como membro da Academia Brasílica dos Renascidos, o engenheiro militar soteropolitano José Antônio Caldas foi responsável por ações interessantes, coordenadas pelo 6º Conde dos Arcos, então vice-rei, e orientadas por membros da Academia como, por exemplo, a expedição às nitreiras de Montes Altos, cujo objetivo foi identificar as vias de acesso às minas e elaborar a cartografia da região (KANTOR, 2004). Tendo em vista os seus objetivos, pode-se dizer que os acadêmicos tiveram um papel fundamental na implantação das políticas administrativas pombalinas, como analisa Kantor: “A proposta dos acadêmicos Renascidos estruturava-se a partir de rotas mercantis, redes burocráticas, laços familiares e relações de afinidade intelectual forjadas com o mundo erudito europeu. As elites pertencentes aos quadros da Academia enredaram-se umas nas outras, permitindo os fluxos de informação em escala local, continental e mundial.”
O programa de estudos da Academia incluía a elaboração das memórias sobre o comércio colonial e sobre o tráfico negreiro com o objetivo de formular uma análise aprofundada da economia no Atlântico Sul, bem como da importância da mão de obra escrava. O motor do interesse destes temas era a implantação de algumas medidas político-administrativas de Pombal, dentre elas, o Diretório de Índios, que iria promover a sua inserção como trabalhadores livres, tratando-os, em tese, de igual para igual com os brancos.
As reuniões literárias eram comuns nas casas dos letrados também no Brasil. A leitura coletiva de textos, dos mais diversos teores, acontecia como uma forma de sociabilidade. Segundo Jancsó (1997), na Bahia setecentista, durante o governo de D. Fernando José de Portugal e Castro, as reuniões ocorriam no palácio, sendo ele um grande incentivador da elaboração de uma história da Bahia.
A Academia Científica do Rio de Janeiro, fundada em 1772, era composta de 9 membros, que se dedicavam ao estudo da história natural, da química, farmácia, agricultura e medicina, e funcionava sob a organização do médico José Henrique Ferreira. Os seus membros eram dedicados à pesquisa e à observação da natureza e ao ensino e nela havia discussões sobre questões políticas, sociais e econômicas.
Os membros das academias literárias, ao lado dos religiosos regulares, tinham acesso às melhores bibliotecas. Segundo Kantor (2204), as melhores bibliotecas estavam nos colégios inacianos, pois era costume da Companhia reservar uma parte da arrecadação com a venda dos seus produtos à compra de livros. A própria produção acadêmica demonstrava familiaridade com a bibliografia circulante na Europa. Sebastião da Rocha Pita foi o herdeiro de uma dessas grandes bibliotecas de propriedade do seu tio, o chanceler da Relação da Bahia, João da Rocha Pita. O padre Agostinho Gomes possuía a maior biblioteca particular do Brasil, com obras de Lavoisier, Buffon, Thomas Paine, inclusive, a Enciclopédia, além de livros de variadas áreas de conhecimento.
Era uma cultura emergente, inspirada pelo Iluminismo, e fazia diferença se perceber participante e ciente dos acontecimentos, mesmo com a defasagem temporal das informações, à medida que não havia periódicos na colônia. Outra forma de adquirir livros era comprar os espólios por arrematação. Os periódicos, apesar da proibição de circulação, eram comprados nos navios que aqui aportavam. Porém, é importante reforçar que esta era uma parcela muito pequena da população brasileira. Até em Portugal os alfabetizados eram poucos, principalmente entre as mulheres. Em ambos os lados do Atlântico a instrução era escassa, não passando das primeiras letras.
REFERÊNCIAS
JANCSÓ, I. A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política no final do século XVIII. In: SOUZA, L. de M. e (Org.). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, v. 1, 1997.
KANTOR, I. Esquecidos e Renascidos: historiografia acadêmica luso-americana, 1724-1759. São Paulo: Hucitec; Salvador: Centro de Estudos Baianos/UFBA, 2004.
PALMA-FERREIRA, J. Academias Literárias dos Séculos XVII e XVIII. Lisboa: Ministério da Cultura e Coordenação Científica/Secretaria de Estado da Cultura/Biblioteca Nacional, 1982.
RIBEIRO, J. S. História dos Estabelecimentos Scientificos Literários e Artisticos de Portugal (nos successivos Reinados da Monarchia). Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, Tomo I, v. I, [s.d].