Gina Veiga Pinheiro Marocci
Na primeira metade do século XVI, o território do Brasil foi dividido em 15 capitanias hereditárias. Os capitães donatários tinham a obrigação de fundar povoados para promover a ocupação da colônia, capturar os nativos para trabalhar na lavoura, principalmente a de cana-de-açúcar, proteger o território, cobrar os impostos para a Coroa e distribuir terras aos colonos. Como já falamos em textos anteriores, alguns povoados se desenvolveram e foram alçados a vilas, como aconteceu com São Vicente, Santos e Olinda. Outros foram abandonados devido a ataques de estrangeiros ou dos nativos. Algumas capitanias não deram muito certo, como a Capitania da Bahia, enquanto que outras cresceram economicamente, com a Capitania de Pernambuco.
O capitão donatário da Bahia foi Francisco Pereira Coutinho, que aqui chegou em 1536 com cerca de 120 colonos, e encontrou europeus convivendo com os tupinambás (CEAB, 1998).
Eram o português Diogo Álvares Correia (o Caramuru) e alguns franceses, todos tripulantes sobreviventes do naufrágio de um navio francês, que mantiveram com os nativos o comércio de exploração do pau-brasil.
Pereira Coutinho demarcou sesmarias e definiu um sítio para a instalação do seu povoado, que devia ter um bom porto e a facilidade de abastecimento de água. Ele escolheu a região entre a Ponta do Padrão e um pequeno outeiro, área que se limitava com a sesmaria de Caramuru. No mapa que ilustra este texto podemos verificar a delimitação das terras doadas a colonos e indicação dos rios de São Pedro, das Pedras (o rio dos Seixos) e Camarão.

Nesse mapa há uma indicação da casa fortificada de Caramuru e a igreja de Nossa Senhora da Graça erguida por ele a pedido da sua mulher, Catarina Paraguassu, por conta de um sonho que teve com uma senhora com o filho nos braços. No final do século XVI, as terras e a pequena igreja foram doadas aos beneditinos, que construíram em 1645 nova igreja e o mosteiro. Em 1770, a nave da igreja foi ampliada, e a fachada modificada conforme o estilo barroco. O conjunto se desenvolve em torno de um pequeno claustro e é tombado pelo IPHAN desde 1938.

No mesmo mapa podemos ver a sesmaria de Pereira Coutinho, com uma grande extensão de orla marítima, na qual forma erguidas estruturas de defesa: uma fortaleza próxima ao local definido como porto, e outra na Ponta do Padrão, região mais avançada ao mar e que servia de orientação aos navegantes. Inicialmente a povoação foi chamada de Povoação do Pereira, depois, Vila Velha. Nela, edificou uma pequena igreja dedicada à Nossa Senhora da Vitória (Nunes, 2013).
Pereira Coutinho tinha fama de arrogante e cruel, por isso os nativos não gostavam dele. Por outro lado, o convívio de Caramuru com os nativos não facilitou a vida dele nem dos colonos.
Além do mais, os nativos eram capturados, forçados a trabalhar na lavoura e eram expulsos das terras produtivas. Como acontecera em outras vilas, os nativos se rebelaram várias vezes, sendo que a de 1545 provocou o ataque aos engenhos de cana-de-açúcar e à povoação do Pereira, o que levou o capitão-donatário a se refugiar na Capitania de Porto Seguro. Na tentativa de retornar à sua capitania, em 1546, Pereira Coutinho naufragou nos arrecifes da
parte sul da ilha de Itaparica onde foi morto pelos tupinambás.
Com a morte de Pereira Coutinho, os seus herdeiros não tiveram como assumir a capitania, que foi retomada pela Coroa. Em 1548, o rei D. João III decidiu pela criação de um governo-geral para a colônia, com sede na Capitania da Bahia. Assim, foi escolhido Tomé de Sousa para governador-geral do Brasil, que partiu de Lisboa em 1º de fevereiro de 1549, com uma frota de seis navios e cerca de mil homens, dentre eles, 6 religiosos da Companhia de Jesus, o
mestre de obras Luís Dias, responsável pelo traçado e construção da cidade que seria a sede do Governo-Geral, colonos, soldados e degredados.
O Regimento do rei para Tomé de Sousa determinava que se construísse uma fortaleza e povoação forte, em local defensável, tendo em vista que a Povoação do Pereira não dispunha das condições necessárias para a empreitada (CEAB, 1998). Esta serviu de morada aos colonos e ao governador-geral, nos primeiros meses até a construção da cidade de São
Salvador da Bahia de Todos os Santos e, conforme determinado no próprio regimento, foram mantidas pessoas a morar na povoação, que passou a se chamar Vila Velha.
REFERÊNCIAS
NUNES, Antonietta d’Aguiar. Conhecendo a história da Bahia: da pré-história a 1815. Salvador: Quarteto Editora, 2013.
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA. Centro de Estudos da Arquitetura na Bahia.
Evolução Física de Salvador. Edição Especial. Salvador: Fundação Gregório de Mattos, 1998.