Com bate papos como parte da programação
Grupo de teatro apresenta em Salvador espetáculo sobre personagem histórica condenada pela Inquisição na Bahia por se relacionar com outras mulheres na Salvador de 1592
Agosto é o mês em que se celebra a visibilidade e o orgulho lésbico. Nesse contexto, A Panacéia traz novamente aos palcos de Salvador a força de Filipa de Souza, uma mulher condenada pela Inquisição na Bahia, acusada de “sodomia”. Filipa, segundo documentação histórica, assume que se relacionou, afetiva e sexualmente, com diversas mulheres e arca com as consequências: é humilhada, açoitada publicamente e degredada. O texto da peça é inédito, escrito por Camila Guilera e Elisa Mendes, que também ocupam as funções de atriz e diretora, respectivamente.
A temporada contará com seis apresentações no Teatro Gregório de Mattos (Praça Castro Alves), até o dia 25, sempre de sexta a domingo, às 19h. Nas duas sextas-feiras, acontecerão sessões de bate-papo após a apresentação. Na primeira semana, teremos a participação da historiadora Valdecir Nascimento, líder e ativista conhecida por sua atuação na Rede de Mulheres Negras do Nordeste e por sua dedicação em promover políticas para as mulheres, para conversar sobre “História, lesbianidades e interseccionalidade”. A sessão do dia 16 contará com recursos de acessibilidade: tradução em Libras e audiodescrição. Já no dia 23, integrantes da equipe do espetáculo (atriz e diretora) vão participar de uma conversa descontraída com o público presente, compartilhando o processo de criação de “Filipa”.
Como explica Camila Guilera, que dá vida à personagem, “não sabemos nada mais sobre seu paradeiro após ser expulsa de Salvador, por isso, escolhemos o teatro para recriar a vida dessa personagem que tanto nos instiga, dando vazão a seus anseios e pensamentos”. Na encenação, a personagem, ao revisitar o seu período entre a prisão, sentença de humilhação, açoite público e degredo, faz uma digressão sobre a própria vida e defende que não tem do que arrepender-se, sabe que o desejo fez a sua vida possível, como uma mulher que, sendo livre em pensamento e alma, buscava “o gosto profundo da vida”.
O espetáculo teve um ótimo retorno do público na primeira temporada que passou pelos Espaços do Boca de Brasa em Cajazeiras e Subúrbio Ferroviário e pela Sala do Coro do Teatro Castro Alves. Recebeu também o 12º Prêmio Ordem do Mérito Cultural da Diversidade LGBT+ do Grupo Gay da Bahia, organização de reconhecimento nacional, pelo seu trabalho de registrar que a homoafetividade sempre existiu e sempre foi perseguida, nos fazendo olhar para o passado para transformar o presente.
A peça é uma realização d’A Panacéia – grupA de teatro, um coletivo com 16 anos de história, sempre composto exclusivamente por mulheres e que, nos últimos anos, vem se dedicando a pensar um fazer teatral alinhado aos feminismos. Dentro dessa perspectiva, escolhe como foco trazer para os palcos histórias de mulheres que marcaram a História, mas são por tantas vezes esquecidas, invisibilizadas e silenciadas. Nessa mesma direção, A grupA tem como princípio a constituição de equipes de trabalho exclusivamente femininas, dando espaço às trabalhadoras da cultura, também tantas vezes deixadas de fora ou em posições menos centrais nas criações artísticas.
A montagem do espetáculo “Filipa” integra o projeto “Mulheres na História e Histórias da Cidade”, contemplado pelo edital Gregórios – Ano III, com recursos financeiros da Fundação Gregório de Mattos, Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, Prefeitura de Salvador e da Lei Paulo Gustavo, Ministério da Cultura, Governo Federal.
Sobre a convidada VALDECIR NASCIMENTO:
Tem 64 anos, filha de Oxossi , nasceu nas palafitas de Alagados, no bairro do Uruguai, em Salvador. Aos 20 anos entrou no Movimento Negro Unificado (MNU). No MNU participou da criação do Grupo de Mulheres do MNU, o GM. Desde então dedicou sua vida à luta de combate ao racismo. Aos 32 anos entrou na Universidade Federal da Bahia (UFBA) para cursar história. Hoje, historiadora e mestra em Educação e Contemporaneidade pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), já foi coordenadora executiva do CEAFRO Programa de Profissionalização de Jovens e Adolescentes Negros do CEAO/UFBA (1995). Também foi consultora do Programa de Combate ao Racismo Institucional no Brasil (PCRI – 2006); superintendente de Política Para as Mulheres da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia -(SEPROMI/2008 a 2010); Professora substituta da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB/ 2009/2010); Notório saber do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR – 2012/2014); é fundadora do Odara- Instituto da Mulher Negra; compõe a Secretaria Executiva do Fórum Permanente Pela Igualdade Racial (FOPIR); é Coordenadora do Brasil na Red de Mujeres
Afrolatinoamericanas, Afrocaribeñas y de la Diáspora. No movimento de mulheres negras no Brasil tem construído importantes agendas para o fortalecimento das mulheres negras no Brasil e na região Nordeste. No Odara esteve na criação da Rede de Mulheres Negras do Nordeste; Julho das Pretas; da Marcha de Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e Pelo Bem Viver (2015). Valdecir acredita no sonho de liberdade e autonomia para a população negra e para as mulheres negras.
Serviço
Espetáculo Filipa
Classificação indicativa 14 anos
Teatro Gregório de Mattos
16, 17, 18, 23, 24 e 25 de agosto, 19h
R$ 20,00 e 10,00
Dia 16 – Bate papo com Valdecir Nascimento sobre “História, lesbianidades e interseccionalidade”.
Dia 23 – Bate papo com Camila Guilera e Elisa Mendes sobre “Pesquisa e construção de Filipa”