Fotografias, que abordam experiências racial e queer, fazem parte da “Sessão 3 – Carte Blanche” exposição artística que ocorreu de maneira física no mês de maio, na Galeria Azur, em Berlim, e que segue online até o dia 19 de abril de 2025
A obra fotográfica do artista visual Wilame Lima realiza uma tarefa necessária e urgente para os dias atuais, marcados por uma crescente intolerância: oferece uma visão autêntica e multifacetada das experiências racial e queer. Os interessados em conferir a experiência instigante proporcionada pelo artista não podem alegar falta de tempo para fazê-lo. Isto porque a exposição artística “Sessão 3 – Carte Blanche”, da qual a obra faz parte, está aberta à visitação online no site da Galeria Azur (galeria internacional de arte moderna e contemporânea), desde o dia 19 de abril, e ficará disponível à apreciação do público, pelo endereço galeriaazur.art/exhibition/session-03/, por mais 11 meses.
Segundo a curadoria da exposição artística “Sessão 3 – Carte Blanche”, o evento reúne obras figurativas e abstratas de nomes emergentes da arte contemporânea, apresentando “um caleidoscópio de estilos, temas e meios”, desde “explorações ousadas de cor e textura a pungentes reflexões sobre questões sociais”. A exposição online é uma continuação da exposição física das obras, que foi realizada na sede da Galeria Azur, em Berlim, na Alemanha, no mês de maio.
Wilame participa da exposição com 10 obras fotográficas: “O tiro”, “Desencarnado” e “Perto de Mim”, que compõem o projeto Drag Queen, de 2023, feito em homenagem a um amigo bastante próximo, assassinado por causa de sua orientação sexual; “Union”, “Behind glass”, “The Arm”, “The Hand” e “The Man”, que fazem parte do projeto After Fear, de 2024, realizado para que o artista explorasse seus próprios medos e o vazio que deixaram quando começou a enfrentá-los na terapia; “Madame Arrive”, fotografia que simboliza a inexorabilidade da morte; e “Bouquet”, que reflete sobre a possibilidade de outros modos de vida.
Das obras apresentadas por Wilame na exposição online, destaque para as fotografias “O Tiro” e “Desencarnado”, do projeto Drag Queen, de 2023, que homenageia seu amigo, vítima fatal de um crime homofóbico, pois ambas compuseram o rol de obras da exposição física realizada na Galeria Azur, em Berlim, entre 19 de abril e 17 de maio.
Na obra “O Tiro”, em que o artista é retratato sendo atirado em uma piscina, Wilame pretende simbolizar todos os tipos de violência a que o amigo foi submetido: sua morte, mas também a violência simbólica cometida pela polícia, que tratou um crime, claramente homofóbico, como latrocínio, e a violência cometida por leitores, que, em sites de notícias, buscaram justificar a morte em decorrência de uma possível conduta da vítima, como se ela fosse culpada e não quem a matou. “Cometer esses atos de violência é atirar uma pessoa à morte”, diz.
Já “Desencarnado”, que retrata o artista flutuando na piscina, simboliza, de acordo com Wilame, o que restou desse ato tão brutal. “Pelo que sei, até hoje, o caso não foi esclarecido. Essa falta de desfecho, de não saber o que realmente houve com meu amigo, é a pior das sensações”, afirma. Por isso, segundo o artista, a escolha por uma imagem de um corpo flutuando. Capturado na fotografia, esse corpo pairará sobre a água para sempre.
O encontro
Ao participar da exposição artística (física e online) na Galeria Azur, Wilame encontra o lugar ideal para manifestar-se enquanto artista. Isso porque, em seu site, a galeria de arte moderna e contemporânea afirma ter como principal objetivo desafiar o modelo convencional de galeria de arte, tornando-a um ambiente mais democrático e menos elitista, em que só alguns poucos privilegiados, por nome e rede de contatos, obtêm destaque. Além disso, afirma que quer promover “uma comunidade inclusiva e de mente aberta que celebra as muitas facetas da expressão artística”, garantindo que seus artistas tenham a oportunidade “de prosperar em seus próprios termos”.
Wilame, por sua vez, busca seu lugar ao sol, sem ter uma origem ou afiliações que lhe abonem, apoiado unicamente em seu próprio talento. Sua história de vida começa em Aracaju, Sergipe, cidade que o artista define como “distante dos grandes centros financeiros” e “onde a especulação da pobreza criou locais interditos para parte da população, inclusive para ele”. Na Universidade Federal de Sergipe, onde cursou jornalismo, tem sua primeira experiência com a fotografia profissional, que é apreendida, nesse primeiro momento, como técnica, documental e neutra.
Gay, Wilame sofre, desde muito cedo, os efeitos da homofobia em sua cidade de origem. A procura de um lugar onde possa se expressar em sua plenitude e que a diversidade seja respeitada, o artista muda-se para o sul do Brasil e posteriormente para o exterior, vivendo na Suíça, Áustria, França e Estados Unidos, onde reside, atualmente, próximo a Miami. “Na passagem por estes países finalmente abandonei o ideal da fotografia neutra e assumi um estilo onírico, sentimental e, por vezes, surreal”, afirma.
Ao naturalizar-se francês, relata o artista, compreende que é também um corpo racializado e suas obras assumem um tom mais político, com foco em temas como colonialismo e homofobia, sem deixar de trabalhar com uma linguagem poética e sensível que permite a abstração. “Cabe lembrar que o próprio ato de abstrair também é uma declaração política, especialmente em face das expectativas impostas aos grupos marginalizados para que contem e recontem suas lutas, numa constante fetichização do sofrimento”, ressalta.
O artista visual pretende, através de suas obras fotográficas, expressar suas dores e dificuldades enquanto corpo racializado e queer, sem que elas caiam na vala comum da romantização e da fetichização. Wilame deseja ir além dessas narrativas, desmistificar estereótipos e expectativas, destacando suas conquistas, aspirações e complexidades. “Ao representar minhas experiências sem reduzi-las a estereótipos ou caricaturas, reivindico a minha própria voz e essência”, finaliza.
Sobre o artista:
Wilame Lima é formado em Comunicação Social e Jornalismo pela Universidade Federal de Sergipe, e pós-graduado em Ciência de Dados pela Faculdade de Administração e Informática Paulista. Em sua passagem pelas artes visuais, explorou a ilustração de imagens, a fotografia em filme e a produção de imagens sintéticas com inteligência artificial. Atualmente, se dedica à fotografia digital, ao autorretrato e à fotografia identitária.
Serviço
“Sessão 3 – Carte Blanche”
Data: De 19 de abril de 2024 a 19 de abril de 2025
Local: Site da Galeria Azur
https://galeriaazur.art/artist/wilame-lima