Por Morgana Montalvão
É fato que o smartphone se tornou algo indispensável para muita gente, pois reúne uma série de aplicativos e facilidades que auxiliam a vida do usuário, sendo utilizado como o principal meio de acesso à internet – o dispositivo é usado por 98,9% da população com dez anos de idade ou mais (159,8 milhões de brasileiros), de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O dado, divulgado em novembro de 2023, integra o módulo Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua do instituto, sendo referente ao ano de 2022. Nesse ano, 161,6 milhões de pessoas utilizaram a internet no país.
A Fundação Getúlio Vargas (FGV), divulgou também no ano passado, na 34ª edição da Pesquisa Anual sobre o Mercado Brasileiro de TI e Uso nas Empresas, que o Brasil possui 1,2 smartphones por habitante, isso dá a incrível quantidade de 249 milhões de celulares inteligentes. O número é maior do que a população brasileira (203,1 milhões) de acordo com o censo de 2022.
Segundo a FGV, no país, são 3,3 celulares vendidos para um aparelho de TV. Há 464 milhões de dispositivos digitais (computador, notebook, tablet e smartphone) em uso (corporativo e doméstico), totalizando mais de dois dispositivos digitais (2,2) por habitante.
Também em 2023, o Brasil ocupou a vice-liderança mundial onde as pessoas mais usam compulsivamente o celular e/ou computadores – com nove horas por dia, atrás apenas da África do Sul. A pesquisa foi realizada pela plataforma Electronics Hub, especializada em informações eletrônicas, através do ‘Digital 2023:Global Overview Report’, da Data Reportal. O levantamento levou em consideração o tempo de tela para pessoas de 16 a 64 anos em 45 países.
Os brasileiros passaram em média 56,6% do dia em frente às telas de smartphones e computadores. Da média de nove horas diárias, quatro horas ( 44% do tempo) são utilizadas para visitar os feeds do Instagram, TikTok e Facebook. Além do mais, 64% dos brasileiros que utilizam smartphones, são assinantes de serviços de streaming on-line.
O uso desmedido de telas digitais, principalmente, o smartphone, pode acarretar problemas para a saúde mental e física. O vício em celular tem até nome: nomofobia, que é o medo irracional de estar sem o eletrônico. O termo surgiu em 2009 no Reino Unido e significa em inglês ‘nomophobia’ (no mobile phone phobia) cuja tradução é ‘fobia de ficar sem o celular’.
A nomofobia caracteriza-se por ser uma dependência patológica da tecnologia. A pessoa fica dependente do uso de eletrônicos (principalmente smartphones ou tablets) e desenvolve sintomas como ansiedade, irritabilidade, problemas de sono e prejuízo nas interações sociais e no trabalho.
A nutricionista Priscila Capistano, 35 anos, começou a notar um aumento da ansiedade devido à notificação das redes sociais. Ela acordava e mexia no aparelho para ver e-mails e notificações. “ Eu uso o Instagram, mas percebi que mal acordava e ia direto para o celular. Sigo páginas de notícias e, às vezes, essas notícias não são boas. Isso vai criando uma ansiedade, o que não faz bem. Estou me controlando quanto ao uso. Adotei o ato de respirar e orar antes de acordar e reduzir o uso da rede social. Tem aquela história de fazer higiene do sono, né? Ou de fazer uma leitura antes de deitar. Eu percebo que quando eu faço uma leitura antes de dormir é muito melhor a qualidade do sono”, conta.
A nomofobia ainda não foi catalogada como uma desordem mental no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM 5 TR), livro referência mundial que classifica os transtornos mentais, sendo utilizado profissionais de psicologia, psiquiatria, nutrição, neurologia e psicopedagogia. Ainda assim, especialistas já reconhecem que o vício em smartphones e telas tornou-se um dos principais males deste século, como explica a psicóloga Fabiane Veimrober de Cerqueira, 36 anos, especialista em terapia cognitivo comportamental.
“Do ponto de vista da psicologia ainda não podemos afirmar que exista um vício em celular, mas já temos conhecimento que o uso em excesso de telas digitais causa muitos prejuízos para saúde mental, tal como aumento da ansiedade, estresse, diminuição do contato social , dificuldade de concentração e outras atividades.
A longo prazo, o uso não apenas de smartphones, mas também de outros tipos de tela podem gerar a mesma sensação causada por excesso de jogos, compras ou comida, gerando uma liberação alta de estímulos e dopamina (neurotransmissor que atua de diferentes formas no sistema nervoso, relacionado com o humor e o prazer) para o cérebro, fazendo o sujeito buscar cada vez mais essa sensação, aumentando o uso do eletrônico”, explica a profissional, complementando que o vício em telas possui similaridade aos efeitos no mente de adicção gerado por drogas, quando o consumo contínuo e compulsivo de uma substância ou comportamento é acentuado, mesmo que isso traga prejuízo e sofrimento. O indivíduo perde a noção do tempo, deixando de lado as obrigações diárias, distanciando-se do convívio com outras pessoas ou prejudicando as tarefas laborais.
O uso desenfreado do smartphone também causa problemas na coluna, especialmente na cervical, acarretando a síndrome do ‘pescoço tecnológico’, resultado da constante inclinação do pescoço para baixo; dores de cabeça, dores nas mãos, tensão muscular e, principalmente, problemas na visão.
Segundo o médico oftalmologista do Hospital Santa Luzia e preceptor da residência oftalmológica da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), Leonardo Pimenta, 46 anos, o uso demasiado do smartphone tem desencadeado “ um crescimento exponencial da miopia no mundo”.
“Além dos fatores genéticos, este novo estilo de vida moderno da população, com o uso excessivo de telas, juntamente com a frequência de transitar em ambientes fechados, privando-se da luz natural, têm provocado um aumento da miopia. O olho míope, é um olho com o tamanho maior do que o normal, e isso faz com que as imagens se formem na frente da retina (camada de tecido nervoso sensível à luz responsável por projetar as imagens enxergadas e enviá-las ao cérebro), tornando a imagem desfocada, de tudo o que está distante para enxergar”, explica o oftalmologista, enfatizando que a exposição prolongada ao brilho da telas próxima ao rosto também causa ressecamento do globo ocular, levando ao uso de colírios para lubrificar os olhos.