Por Roberto Aguiar
A peça teatral ‘Adelino’, da Cia. Operakata de Teatro, da cidade de Vitória da Conquista, no sudoeste baiano, ganhou o prêmio de Melhor Espetáculo Infanto-juvenil no 29° Prêmio Braskem de Teatro. Eu conversei com Ketia Damasceno, produtora e operadora de vídeo e áudio do espetáculo.
Ela falou sobre a recepção do espetáculo pelo público, o desafio em produzir o teatro mudo, a felicidade das indicações e premiação no Braskem de Teatro 2023, a história de 20 anos da Cia. Operakata de Teatro e sobre as barreiras superadas nessas duas décadas para produzir peças teatrais em uma cidade do interior baiano.
ROBERTO AGUIAR – Que mensagem o espetáculo ‘Adelino’ quer passar ao público?
KETIA DAMASCENO – Apesar de ser classificado como um espetáculo infatojuvenil, ‘Adelino’ é pensado para que o público de todas as idades possa assistir. A peça conta a estória de seu Aloísio, um homem solitário, que ao se mudar para uma nova casa, descobre que nem todos os antigos moradores partiram. De forma lúdica, a quebra do cotidiano desse senhor, desperta novas possibilidades de se reinventar.
Uma história de amizade e acolhimento, em uma casa uma casa temperamental e ele, Adelino, que vai se revelando aos poucos para o público, que acompanha essa estória como se estivesse do outro lado da rua. Como é uma peça muda, tudo tem sua importância. A casa conversa, é um personagem que tem vida própria. Inserimos elementos do audiovisual que ajudam nas diversas interpretações que o público pode fazer do espetáculo, proporcionando um despertar de memórias. Isso é a vivacidade do teatro.
RA – Quais são os desafios em fazer o teatro mudo?
KD – Operakata vem estudando o teatro mudo desde 2012, quando produzimos o espetáculo ‘O Circo de Solenildo’. Em 2016, exibimos a peça ‘Pariré’. Agora fechamos essa trilogia com ‘Adelino’. Os desafios são muitos, a começar que estamos em momento na sociedade de muita fala, muita informação, é tudo rápido.
O teatro mudo tem outro tempo, ele é contemplação, é feito para despertar reflexões. Por isso, exige um estado de presença muito grande dos atores e de toda a equipe, seja dos atores em cena como da operação de áudio e vídeo, da luz, do cenário, do conjunto de elementos que garantem a execução da peça. Se um desses elementos falhar é difícil corrigir sem demonstrar o erro. O teatro mudo exige muita expressão corporal e muita dramaturgia. As sensibilidades precisam ser potencializadas.
O trabalho de interpretação tem que ser mais trabalhado, já que o texto está no corpo, no gesto e no olhar. Isso exige o estar presente. A plateia sente se não estamos presentes. Ela também não fica presente se não estamos. Precisa dessa conexão. Esse olhar mais fundo que fazemos do público e do público sobre nós é fundamental. É isso que dá as oportunidades de múltiplas interpretações ao espetáculo.
RA – ‘Adelino’ recebeu cinco indicações ao 29° Prêmio Braskem de Teatro. Além da categoria espetáculo infanto-juvenil, que foi premiada, tivemos os atores Ricardo Fraga e Kécia Prado concorrendo na categoria ator e atriz, respectivamente e, Gilsérgio Botelho concorrendo nas categorias direção e cenografia e Iluminação. Como vocês receberam essas indicações ao principal prêmio do teatro baiano?
KD – Estávamos ensaiando. Peguei o celular para ver a hora e vi a mensagem que falava das indicações. Ficamos felizes e surpresos. Não esperávamos todas essas indicações. A felicidade é porque as indicações e a premiação que recebemos é um reconhecimento e valorização do nosso trabalho, que é feito com muita responsabilidade e esforço.
Trabalhamos com recursos próprios, reunindo pessoas que acreditam no teatro. Passamos por uma pandemia, que eu chamo de pandemônia, e seguimos trabalhando, acreditando na força da arte, da cultura e do teatro.
“A premiação no Braskem de Teatro é o reconhecimento e valorização do nosso trabalho”
RA – A Cia. Operakata de Teatro está completando 20 anos. Como tem sido essa caminhada?
KD – A Companhia foi em criada em 2003, em Vitória da Conquista, pelo diretor Botelho, onde apresentamos ao público o espetáculo ‘O Sonata dos Loucos”. Seguimos até hoje um trabalho continuado de pesquisa e criação em artes cênicas, somando um total de 16 espetáculos em nosso repertório.
Nossas atividades são desenvolvidas na nossa sede batizada de Espaço Quixotesco, e está localizada no bairro mais populoso da cidade. Por acreditar no trabalho de cocriação e sempre valorizando o potencial individual, sempre trabalhamos com teatro de grupo, produzindo espetáculos autorais que possam levar para o palco uma linha de pensamento e um modo de fazer teatro sob um ponto de vista crítico acerca da realidade a qual está inserida, especialmente as relações humanas.
Essa nossa forma pensar o teatro temos nos levado a participar de diversos festivais nacionais e internacionais e a receber premiações e reconhecimento do público. São duas décadas de muita luta, muitas barreiras que tivemos que superar e que seguimos superando até hoje. Mas fazemos isso com amor, porque é nisso que acreditamos.
RA – Qual o desafio de fazer teatro no interior do Estado?
KD – São muitos os desafios e as dificuldades. Tem enfrentado isso com trabalho em grupo, um trabalho coletivo. Somos um pequeno grupo, contudo somos unidos por um único propósito, que é o teatro. Isso conta muito.
Outra vantagem que temos é a nossa sede, um sonho que conseguimos materializar em 2014, que ajuda concretizar o compromisso da Operakata com o princípio da valorização das artes como um importante veículo para a transformação social. Por isso, o grupo acredita que o espaço é mais do que uma sede, é um ponto de resistência e de desenvolvimento de pensamento crítico, de desenvolvimento criativo e sensível humano.
O que ajuda no enfrentamento às dificuldades, já que a nossa cidade, apesar de ser a terceira maior da Bahia, só conta com um centro de cultura, que ficou 5 anos fechado para reforma. Tem uma disputa pelo uso do espaço, por existir só ele. Existe um pequeno teatro de bolso, mas está fechado há 3 anos e sem expectativa de reabertura. Política pública de financiamento é zero.
O que fazemos é um teatro de guerrilha, temos que ir guerra para fazer cultura e arte. É muito complicado. Trabalhamos com recursos próprios, participamos de editais e contamos com o apoio de amigos e parceiros para movimentar a cena e dar continuidade ao nosso trabalho.