Ao todo, 41 obras fazem parte da mostra que destaca em suas telas diversas expressões de negritudes e da periferia recifense
A arte de Jeff Alan traz o protagonismo negro para a arquitetura expositiva da Caixa Cultural Salvador, a partir do dia 21 de maio (terça-feira), às 19 horas. A mostra “Comigo Ninguém Pode – a pintura de Jeff Alan” apresenta personagens reais da periferia do Recife e também de outras capitais que, depois de se apresentar na própria terrinha e de circular pelo Rio de Janeiro, aporta, agora, em território baiano. Nas 41 obras, com uma tela e um mural inéditos, o artista visual compartilha com o público as expressões, trejeitos, traços e texturas retintas de negritudes cotidianas testemunhadas em seu dia a dia. O projeto tem o patrocínio da CAIXA e do Governo Federal.
A mostra já traz no próprio título a força da ancestralidade e do olhar que impulsiona a arte de Alan. “Comigo Ninguém Pode” é prova de que a planta mística que garante proteção e prosperidade em muitos lares brasileiros é também a força que move e inspira quem caminha confiante e incansável no desejo de expandir conexões e de ampliar as possibilidades de existências negras. É com essa missão que Jeff Alan chega à Salvador para abertura deste evento que tem entrada gratuita e fica em cartaz até o dia 28 de julho de 2024. Na ocasião, o artista visual vai conduzir as pessoas presentes para uma visita guiada pelo espaço.
Ninguém pode com Jeff Alan
“Impossível”, palavra que não existe no dicionário de uma equipe que sonha junto. Sob a curadoria de Bruno Albertim, as pessoas pretas enobrecem as telas e estampam novos lugares para si. Ao retomar essas trajetórias, a exposição reposiciona os holofotes e atualiza no tempo o que – historicamente – negaram aos artistas negros: protagonizarem e escreverem, ou, neste caso, pintarem a sua própria história. É assim que olhando o outro, como a si mesmo, a mostra disponibiliza mais de 40 trabalhos figurativos, 2 inéditos. Obras – de diversas dimensões – em acrílica sobre tela e desenho sobre papel que figuram o cotidiano e a cultura das ruas por onde transitam as personagens de Jeff.
Para Albertim, o trabalho primoroso de Alan resgata as narrativas e os rostos ancestrais dos que foram dizimados da história. Dos que choraram a dor de rupturas familiares, de extermínio, de escravização de seus corpos. Na percepção do curador, o artista reescreve a saudade permanente e sem rostos, cuja face sumiu da história. “Jeff Alan preenche os espaços em perverso branco da história. Sua potente narrativa visual, preenche fraturas da memória coletiva e projeta a cura de antigas feridas”, afirma Bruno.
Para ele, ao trazer seus contemporâneos para o centro da composição e a lugares sociais historicamente negados, o trabalho de Alan produz memória e poder social. “Alan põe em decomposição a figura do preto em estado de subalternidade, degradante e naturalizado”, declara o curador que vê com otimismo a chegada da mostra em Salvador, no território da maior população de origem africana fora de África. “Na cidade do abolicionista, Luiz Gama, filho da líder, Luísa Mahin, Jeff nos impele em sua gramática visual a pactuar e impor a nossa liberdade, a cada vez que nos quiserem escravizar outra vez”, declara.
Periferias Paralelas
É da comunidade do Barro, na Zona Oeste do Recife, onde vive e mantém seu ateliê, que o artista encontra toda a matéria-prima para a sua arte. Daltônico, Jeff Alan pinta desde a infância, motivado pela mãe. É da periferia, tecido urbano de áreas vulnerabilizadas, que ele nutre os ingredientes do que tece com os seus pincéis. É deste lugar de fala e de potência que Alan multiplica as vozes das quebradas e a leva para o mundo das suas pinturas. Corpos retratos de periferias brasileiras, como as de Salvador.
Fruto de um grande sonho coletivo, de inquietação e revolta pelas invisibilidades históricas que acompanham os corpos negros, Jeff acredita nessa exposição como o sonho de um povo. “Antes de ir para o museu, essa exposição é para as periferias. A minha obra nasce na rua. Espero que o público se sinta representado e olhe essas obras como quem se olha no espelho”, declara.
Olhar guardião
As pessoas pintadas por Jeff Alan fazem parte do seu dia a dia. Gente, geralmente, conhecida, com quem já teve alguma troca. É assim, com diálogo, respeito e consentimento que Jeff descreve a sua relação com as personalidades pintadas. No entendimento de sua obra como um ato político, o artista revela que esses retratos nascem durante a pandemia, ao decidir pintar pessoas em situação de rua. “Essa é a minha forma de reivindicar, de falar de sonhos, vida e vontade de viver”, declara.
A expectativa pela chegada da mostra em Salvador são as maiores e as mais felizes. Jeff esteve uma única vez de passagem na cidade. Agora, com pouso mais demorado, alimenta um sentimento de casa e reencontro. “Esse é um trabalho muito sério, o trabalho de uma vida. De dedicação exclusiva. Isso é tudo o que eu sonho e acredito. É a minha religião. É o meu grito”, diz.
A exposição conta com legendas em braile e QR code com a audiodescrição das peças, que destacam os traços e biótipos de crianças, jovens e adultos negros que entrecruzam o caminho do artista. Os profissionais que atuam nessa iniciativa, da seleção da monitoria ao curador, artista, produção e assessoria são todas pessoas negras.
Ainda dentro da agenda de atividades, o projeto traz nos dias 12 e 13 de junho oficinas com Jeff Alan voltadas para pessoas com alguma prática artística. Mais informações sobre essa atividade podem ser acessadas, em breve, no site da CAIXA Cultural.
As andanças pelo mundo
Jefferson Alan Mendes Ferreira da Silva, nasceu artista e sonhava em ser, exatamente, quem ele é hoje. Quando criança se imaginava expondo as suas telas pelo mundo. Do pincel faz a sua expressão mais genuína e preenche de cor e de sentidos as negritudes urgentes que se agigantam em sua frente. O artista já teve suas obras expostas em países como França e Inglaterra. Hoje, conquista, cada vez mais, a atenção do público e da crítica ao ser um dos nomes mais promissores das artes visuais no mercado de arte contemporânea brasileira.
Serviço
O quê: [Artes visuais] Exposição “Comigo Ninguém Pode – A pintura de Jeff Alan”
Local: CAIXA Cultural Salvador – Rua Carlos Gomes, 57, Centro.
Abertura: 21 de maio (terça-feira), às 19h, com a presença do artista Jeff Alan
Período: de 21 de maio de 2024 a 28 de julho de 2024
Entrada gratuita
Visitação: terça a sábado, das 10h às 20h; domingos e feriados, das 10h às 18h
Classificação indicativa: Livre