Jéssica Magalhães, biomédica esteta especializada em pele negra, ressalta a importância do autocuidado durante tratamentos de saúde intensivos.
Nos períodos mais difíceis, como durante tratamentos de saúde intensivos, muitas vezes o foco está somente no tratamento da patologia. Entretanto, além do tratamento médico, o apoio emocional se torna uma peça fundamental na jornada de recuperação. Para muitas mulheres, cuidar da aparência pode ser um dos caminhos para se reconectar consigo mesmas e encontrar algum equilíbrio emocional em meio às incertezas.
Quando se trata de mulheres negras, o autocuidado estético adquire um significado ainda mais profundo. A falta de representatividade em produtos e padrões de beleza historicamente voltados para estéticas eurocêntricas pode fazer com que muitas sintam dificuldade em se reconhecer e se valorizar em situações de vulnerabilidade. Mas a estética, ao invés de se focar na beleza exterior, pode servir como uma ferramenta de resgate da identidade e de fortalecimento interno.
De acordo com o estudo “Beholding the Beauty of Self: The Psychological Integration of the Afrocentric-Self among African-American Females Socialized in a Eurocentric Aesthetic”, realizado pela Universidade de San Diego, o autocuidado é um componente essencial para o bem-estar emocional das mulheres negras. O estudo aponta que práticas que envolvem a valorização da aparência ajudam a restabelecer uma conexão mais forte com a própria identidade, promovendo uma sensação de controle e confiança, aspectos que são fundamentais.
Durante tratamentos invasivos, como a quimioterapia ou outros tratamentos de longa duração, as mudanças na aparência física são inevitáveis. Esses tratamentos podem alterar drasticamente a pele, os cabelos e outras características físicas. Para muitas mulheres, essas mudanças impactam diretamente a autoimagem e, por consequência, a autoestima.
Jéssica Magalhães, biomédica esteta especializada em pele negra, acredita que o cuidado com a aparência pode desempenhar um papel importante no apoio emocional durante essas fases. “O autocuidado estético não se trata de vaidade ou superficialidade. É uma maneira de as mulheres se reconectarem com elas mesmas e manterem algum controle sobre seus corpos em momentos em que muitos aspectos estão fora do controle”, afirma.
Ela explica que, especialmente durante campanhas como o Outubro Rosa, é fundamental criar espaços em que as mulheres possam se cuidar, compartilhar suas experiências e encontrar apoio mútuo. “Quando as mulheres estão em um ambiente de apoio, onde podem falar sobre suas lutas e ao mesmo tempo se cuidar, a estética deixa de ser sobre aparência e se torna uma ferramenta de e fortalecimento emocional”, observa.
O impacto das mudanças na autoestima
Para muitas mulheres, os tratamentos médicos podem levar a uma perda temporária ou permanente de algumas características físicas que costumavam definir sua identidade. No caso das mulheres negras, as alterações podem ser ainda mais intensas, devido à pouca oferta de produtos adequados. Essas lacunas podem agravar o impacto emocional das mudanças físicas, criando uma sensação de isolamento ou falta de pertencimento.
Jéssica acredita que oferecer soluções estéticas personalizadas para pele negra é uma maneira de ajudar essas mulheres a se reconectarem com suas raízes e reafirmarem suas identidades. “O cuidado estético, quando feito de forma consciente e respeitosa, pode ser um ato de resiliência e fortalecimento. Ao cuidar da pele, dos cabelos e até das unhas, a mulher não está apenas melhorando sua aparência, mas está reafirmando quem ela é, se reconectando com sua ancestralidade e encontrando força em si mesma”, diz ela.
O autocuidado não precisa ser algo grandioso ou complexo. Segundo Jéssica, a implementação de pequenas práticas no dia a dia pode ajudar a mulher a manter uma sensação de normalidade e controle sobre seu corpo. “O ideal é começar com uma rotina simples, que pode incluir a hidratação adequada da pele, o uso de protetor solar e a escolha de produtos que respeitem a textura e a tonalidade da pele negra”, explica a biomédica.
Ela também recomenda que, além dos cuidados estéticos, as mulheres busquem se alimentar de forma equilibrada e reservar tempo para cuidar da saúde mental. “Ler um livro, meditar, passar um tempo com pessoas queridas, tudo isso contribui para o fortalecimento emocional. O autocuidado vai muito além da estética; ele envolve todo o ser”, ressalta.
Em um cenário de desafios e incertezas, cuidar de si mesma é uma forma de encontrar equilíbrio e força. Nesse contexto, não se trata de buscar uma beleza idealizada ou atender a padrões externos, mas sim de reafirmar a própria identidade, especialmente em momentos de vulnerabilidade.
Para as mulheres negras, o cuidado estético pode se tornar um ato de resistência e um caminho para restabelecer a confiança e o bem-estar emocional. Ao reconhecer a importância do autocuidado, tanto físico quanto mental, essas mulheres podem se fortalecer para enfrentar os desafios com resiliência.