Pedagogia Griô aposta na ferramenta para valorizar criação coletiva
Quem nunca se divertiu com aquela brincadeira que apresenta um caminho cheio de desafios e, a cada passo, nos aproxima de uma conquista? Essa é a essência dos jogos de trilha, mas a diversão ganha significados de equidade e cooperação com missão coletiva quando se transforma em ferramenta de uma educação fundada na oralidade, antirracista e antipatriarcalista, que prioriza a produção partilhada do conhecimento. Foi pensando nisso que a educadora baiana Lillian Pacheco não hesitou em incluir a atividade como parte fundamental do curso de formação promovido pelo Pontão de Cultura Ação Griô Bahia, contemplado pela Lei Cultura Viva, que tem o objetivo de estimular a conexão entre novas gerações e saberes tradicionais, por meio da pedagogia griô.
A criação compartilhada é um dos pontos altos do curso, que conta com a participação de 20 mestras e mestres griôs e beneficia 40 jovens de comunidades do interior da Bahia. Sob orientação de Lillian Pacheco, que é criadora do método da pedagogia griô e coordena o projeto em parceria com o educador Márcio Caires, a turma recebeu a missão de construir jogos com temáticas relacionadas às tradições de suas comunidades. Ao final do curso, que está em andamento, os produtos pedagógicos terão aplicação prática em escolas públicas e comunitárias de 15 municípios baianos. Os resultados também serão apresentados no Encontro Estadual da Rede Ação Griô Bahia e no Encontro Nacional da Pedagogia Griô, em julho.
Para desenvolver os trabalhos, a turma se espelha na experiência de diversos jogos criados no contexto dos cursos da Pedagogia Griô. Um dos primeiros jogos de trilha, elaborado no final dos anos 1990, retrata o Quilombo do Remanso, localizado na Chapada Diamantina, e tem a educação quilombola como tema. Outra fonte de inspiração é o jogo criado pelo terreiro Ilê Axé Odé Layê Lubô, liderado pela ialorixá Mãe Luciene Bonfim, como resposta ao preconceito religioso. A prática já foi destaque também no meio acadêmico, quando a professora Izabel Dantas apresentou essa tecnologia como foco de seu doutorado na Uneb (Universidade do Estado da Bahia) e pós-doutorado na Universidade de Málaga, na Espanha, ilustrando o protagonismo das mulheres na luta pelo direito à terra.
Liberdade de criação está na essência do jogo, mas a “brincadeira” segue alguns princípios e um modelo de ação pedagógica que integra vários saberes diferentes. Como o próprio nome sugere, os jogos precisam apresentar um caminho a ser trilhado em busca de um objetivo comum. Esse mapa pode ser representado em um tabuleiro ou um tecido, com técnicas como pintura e bordado, tendo como “casas” locais icônicos da comunidade, como uma vila de pescadores, a sede de uma manifestação cultural ou a moradia de uma liderança. Traços marcantes da paisagem também podem ser incorporados, assim como referências a ofícios, costumes e “causos” que atravessam gerações graças à tradição oral. Até sons e aromas podem ser incluídos, tornando a experiência ainda mais sensorial.
Pode haver variação na dinâmica e no número de pessoas jogadoras, que são representadas por objetos relacionados à cultura do lugar – um patuá, por exemplo. Para avançar, é preciso responder perguntas e realizar desafios sorteados em cartelas, cujas respostas devem estar em um livreto para consulta. A pontuação também é registrada de forma simbólica, com elementos como grãos ou miçangas. A única regra que não pode ser esquecida é que o jogo deve ser colaborativo. Diferentemente das modalidades competitivas, os jogos de trilha na pedagogia griô são utilizados como instrumento de aprendizagem lúdica e a conquista é sempre coletiva.
O público interessado em conhecer mais sobre a prática dos jogos de trilha como instrumento de aprendizagem pode acessar o site da Escola de Formação na Pedagogia Griô: https://pedagogiagrio.com/metodologia.