Por Gina Marocci
Falar da história dos bairros de Salvador é como tirar leite de pedra, porque essa história está espalhada, em gotas, em livros e documentos históricos, que precisam ser relidos em busca dessas pequenas informações. Assim acontece com o bairro de Itapuã, tão famoso pelo mundo afora nas vozes de grandes artistas como Vinícius de Moraes, Toquinho e Caetano Veloso, por exemplo. Para começar, precisamos compreender o significado dessa palavra tupi, que quer dizer pedra de ponta ou ponta de pedra (acredita-se que a pedra onde foi construído o farol deu nome ao lugar). Os tupinambás foram seus primeiros habitantes, povo que tinha muitas aldeias ao longo da costa da Capitania da Bahia.
As primeiras informações que se tem notícia sobre Itapuã são do século XVI, quando a região fazia parte da primeira sesmaria de Garcia d’Ávila Pereira de Aragão, cujas terras iam de Itapuã até Tatuapara, onde construiu o Castelo da Torre. Em suas terras de Itapuã, Garcia d’Ávila ergueu currais para a criação de gado nelore.
No início do século XVII, com o desenvolvimento da pesca da baleia e dos postos de Itaparica, foram criados entrepostos baleeiros e reservatórios de pedra e cal para armazenamento do óleo de baleia no Rio Vermelho, na Barra e em Itapuã (Nunes, 2013). A pesca das baleias marcou o bairro de pescadores por séculos. Hoje, elas podem nadar garbosamente nas águas de Itapuã, entre os meses de julho e novembro.
O bairro abrigou no século XVIII o Quilombo do Buraco do Tatu. Ele foi fundado em 1744 e permaneceu ativo até 1763, em uma área que corresponderia, hoje, ao bairro de Itapuã e a Estrada Velha do Aeroporto. Abrigou centenas de mulheres e homens negros em busca da liberdade, não apenas de si mesmos, mas dos escravizados que moravam na região , inclusive em Salvador. Para isso, planejavam fugas, ataques e se mobilizavam para libertar outros escravos (Nunes, 2016). A comunidade quilombola vivia da agricultura, principalmente da pesca, atividade que marca a região até os dias atuais. No início do século XIX, os africanos remascentes desse quilombo foram protagonistas das revoltas de 1814 e 1816.
Conhecido pelas belas praias, o bairro de Itapuã tem um pequeno patrimônio arquitetônico que merece nota. A Igreja de Nossa Senhora da Conceição, que fica na Praça Dorival Caymmi, foi erguida pelos moradores, em terreno doado por José da Rocha palheiros no século XVIII. O farol foi construído em 1873 para orientar os navegantes e sinalizar os bancos de areia.
Até as primeiras décadas do século XX, o arrabalde manteve-se como uma vila de pescadores, com características mais rurais que urbanas. A partir de 1940, por conta do processo de urbanização da cidade, e pela construção do aeroporto e da Base Aérea de Salvador, houve um crescimento e maior ocupação do bairro, principalmente por conta da fixação dos funcionários da base, da instalação da rede elétrica e da abertura de estradas que o ligavam ao centro urbanizado (Silva; Araújo, 2021)). Entre 1940 e 1960, o bairro sofre o processo de loteamento para comercialização de terrenos para veraneio, o que mudou a dinâmica dos antigos moradores, tendo em vista que a pesca não conseguia mais dar-lhes o sustento. O bairro, então, consolidou-se como região de veraneio, atraindo artistas que lhe deram fama internacional.
REFERÊNCIAS
NUNES, A. d’A. Conhecendo a história da Bahia: da pré-história a 1815. Salvador: Quarteto Editora, 2013.
NUNES, D. Itapuã: Quilombo do Buraco do Tatu e a luta contra escravidão em Salvador-BA. Disponível em: https://ungareia.wordpress.com/2016/05/21/quilombo-do-buraco-do-tatu-e-a-luta-contra-escravidao-em-salvador-ba/#:~:text=novembro%202019-,ITAPU%C3%83%. Acesso em: 24 mar. 2024.
SILVA, C. V. D. T. da; ARAÚJO, M. M. S. Itapuã. Publicado em 12 de janeiro de 2021. Disponível em: https://observatoriobairrossalvador.ufba.br/bairros/itapua. Acesso em: 25 jan. 2024.