Por Gina Marocci
O verão está chegando ao fim, mesmo que não faça muita diferença para a Região Nordeste, já que não temos mais os sinais do outono. O verão é o período do ano em que as capitais do Nordeste são mais visitadas, pois as águas amenas do mar são as preferidas para turistas e nativos. Ninguém pode negar que as praias nordestinas são maravilhosas, no entanto, mesmo com cidades litorâneas mais que centenárias, o lazer do banho de mar não é uma prática tão antiga entre nós.
Em primeiro lugar, a presença do sal do banho de mar incomodava aos que não tinham o banho diário como hábito, mas era usual para o tratamento de doenças de peles dos escravos, para diversão das crianças das camadas mais pobres e, à noite, longe dos olhares curiosos, como diversão dos adultos depois da labuta diária (Paz, 2020). Mas, com os estudos sobre os benefícios dos banhos de mar para o tratamento de doenças glandulares, as prescrições médicas influenciaram a adoção dessa terapia no século XIX (Anjos, 2018). A terapia pelo mar, além dos banhos, envolvia o caminhar na areia, respirar o ar marinho e observar os animais, prática que se tornou frequente nas classes mais abastadas na segunda metade do século XIX.

Os banhos de mar eram recomendados pelos médicos da corte de D. João VI e de D Carlota Joaquina, que o utilizavam frequentemente para tratar doenças. Em 1817, por conta de uma infecção provocada por uma mordida de carrapato, D. João VI foi levado a tomar banhos de mar para a cicatrização de ferimentos. Ele era levado de liteira até o mar onde mergulhava a perna inflamada; quer dizer, não era exatamente um banho de mar. A família hospedava-se numa casa que pertencia ao negociante de café Antônio Tavares Guerra, no Caju. Essa casa ficou famosa como a Casa de Banho de D. João VI.
Era comum na Inglaterra o uso das máquinas de banho (bathing machines), cabines fechadas, puxadas por cavalos, nas quais as pessoas trocavam as roupas e eram levadas até uma profundidade de água para se banhar, não se expondo desnecessariamente a todos os banhistas, isto é o que as boas maneiras determinavam. Essas máquinas de banho eram muito populares entre o século XVIII e o século XX.
Será que elas foram usadas no Brasil? Há registros fotográficos das cabines para troca de roupa nas praias do Rio de Janeiro, costume que devia existir em outras cidades litorâneas.

Ainda na primeira metade do século XIX instalou-se no Rio de Janeiro a empresa Fluctuante, que era uma plataforma flutuante chamada de barca de banhos. O acesso à plataforma era por pequenos barcos, e nela havia camarotes, salas de espera e piscinas, nas quais separavam-se os homens das mulheres, quando solteiros. Em 1855 foi inaugurada, ao lado dela, uma barca para aulas de natação.
Em 1844, no Recife, uma barca de banhos foi instalada no rio Capibaripe. Mas foi o Grande Estabelecimento Balneário de Pernambuco, nome oficial da Casa de Banhos dos Arrecifes, quem durou como estabelecimento balneário. Ela foi fundada por Carlos José de Medeiros em outubro de 1880, com o intuito de auxiliar no tratamento de moléstias como a beribéri e a febre tifoide e doenças nervosas. No regulamento do estabelecimento eram informados o horário de funcionamento, o tipo de transporte para o acesso e saída dos clientes, os trajes de banho que eram permitidos e normas de convivência (Anjos, 2018). Os banhistas chegavam em barcos, trocavam as roupas nos camarotes e desciam por escadas às piscinas escavadas nos arrecifes.

(https://jornaldigital.recife.br/2024/01/12/casa-de-banhos-um-dos-marcos-da-ligacao-do-recife-com-o-mar/)
Não há registros desse tipo de empreendimento em Salvador, no entanto numa cidade com uma significativa extensão de faixa litorânea, o banho de mar como terapia para o tratamento de doenças do corpo e da alma, em águas com temperatura amena como as nossas, devia atrair as pessoas. De acordo com Daniel Paz (2020), a Península de Itapagipe era procurada para banhos por suas águas tranquilas, assim como o Rio Vermelho, um arrabalde que se tornou lugar de veraneio no século XIX. Em ambos os casos, a presença dos pescadores com sua labuta diária era a marca principal.
Ao banho de mar como lazer uniu-se uma tradição centenária de festejos e louvores a santos católicos e orixás, com direito a procissões marítimas e banhos de mar, não apenas como lazer, mas como purificação espiritual.
As roupas de banho mudaram, das peças pesadas, que cobriam o corpo todo das mulheres, para trajes de duas peças, em tecidos de algodão e seda, que deixavam à mostra os braços e as pernas até os joelhos.

https://www.abelyfashion.com/pt/the-evolution-of-swimwear-from-ancient-times-to-modern-day.html
A evolução foi rápida e adotaram-se os macaquinhos marcados por cintos, que deixavam as pernas à mostra. Chapéus e toucas também faziam parte dos trajes de banho.
REFERÊNCIAS
ABELY. A história e a evolução das roupas de banho: quando as roupas de banho foram inventadas? Disponível em:
https://www.abelyfashion.com/pt/the-history-and-evolution-of-swimwear-when-was-swimwear-invented.html#Ancient-Swimwear. Acesso em: 4 mar. 2025.
ANJOS, B. C. dos. O encontro com as virtudes terapêuticas dos banhos de mar
na Casa de Banhos dos Arrecifes no século XIX. Disponível em: https://www.encontro2018.pe.anpuh.org/resources/anais/8/1535670387_ARQUIVO_Trabalhocompleto-ANPUH-BIANCA-2018.pdf. Acesso em: 27 fev. 2025.
PAZ. D. J. M. Beira do mar, lugar comum: os primórdios do lazer e bem-estar à beira-mar da cidade do Salvador séc. XIX. 2020. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2020.