Por Morgana Montalvão
As cervejas artesanais já conquistaram o paladar do soteropolitano. Produzidas com os mais variados ingredientes, apresentando de notas amargas até sabores enriquecidos com nuances frutadas, esse movimento cervejeiro cresce ávido por novidades e características marcantes. Na Bahia, algumas cervejarias artesanais vêm se destacando por produzir bebidas de qualidade e obtendo reconhecimento fora do país.
A MinduBier nasceu por acaso, resultado de um hobby de Gustavo Miranda Martins, 40 anos, arquiteto. Ele começou a fabricar cerveja caseira por curiosidade. “ Um primo meu me apresentou a esse universo [cervejas artesanais] e fiquei encantado. Sou muito interessado por esse mundo das bebidas, principalmente a cerveja. Me perguntava como é que é feita? Como é o processo? Para mim, isso sempre foi um grande mistério e há um universo a ser desbravado nessa questão. Você descobre que dá para produzir bebidas com sabores e aromas inimagináveis. São sensações muito únicas e, assim, comecei a me aprofundar”, conta ele, que começou a produzir a bebida em casa no ano de 2013.
Gustavo nunca se acostumou com a típica cerveja que o brasileiro está habituado a beber. Para ele, a cerveja é mais que uma bebida amarela que contém álcool. Beber cerveja é uma experiência. “O brasileiro se acostumou com aquele líquido de cor amarelada que você bebe e deve estar muito gelado e pronto. Para mim nunca foi isso. As cervejas artesanais despertam sensações únicas. Há insumos que dão um toque especial no sabor dessa cerveja. Não é apenas uma simples bebida”.
O nome da marca é uma junção do apelido de Gustavo, conhecido como “Mindu”, com a palavra bier, que significa cerveja em alemão.
Desde então, a cervejaria tem conquistado seu espaço. Primeiro, ele apresentou a cerveja aos amigos, e, depois, apresentou o produto para pontos de venda específicos que gostaram da bebida e passaram a comercializá-la. Ao tomar expertise do processo de fabricação, ele percebeu que o hobby poderia trazer um bom retorno financeiro. “Comecei a apresentar para as pessoas e elas começaram a gostar das minhas cervejas. Depois, a bebida chegou a alguns pontos de venda, aí a coisa foi se expandindo e profissionalizando e, hoje a marca é bem aceita e bem conceituada no mercado ”, complementa o cervejeiro, que no começo também desenvolveu o rótulo da MinduBier artesanalmente.
Fábrica, concurso de cerveja e prêmios internacionais
A brincadeira cresceu e deu inúmeros frutos. O mercado de cervejas artesanais começou a surgir em Salvador em 2010, mas em 2014, 2015 aconteceu o boom e a demanda por este tipo de cerveja começou a surgir nos bares. A propaganda boca a boca multiplicou-se e a MinBubier, inclusive, começou a enviar cervejas pelo correio para outros estados. Em 2016 a marca participou de um concurso de cerveja caseira e aí foi o empurrão para começar a primeira produção industrial.
“Chegou a hora de transformar a marca para algo maior, foi aí que a empresa participou de um concurso de cerveja caseira em São Paulo. A premiação desse concurso era uma produção regularizada, onde poderia vender a bebida em larga escala. A MinBubier venceu. Esse concurso tinha um júri muito técnico e a gente fez o melhor. A partir disso, começou a nossa primeira produção grande. Esse foi o nosso grande empurrão e começamos muito bem”, enfatiza Gustavo.
Durante um certo tempo, a marca operava com produção cigana, quando uma cervejaria produz a bebida de maneira nômade, utilizando instalações e equipamentos de outra empresa. Foi em 2021 que a MinBubier passou a operar na atual fábrica em Lauro de Freitas. De 2016 até agora, a cervejaria já produziu 90 rótulos de cervejas dos mais variados sabores, aromas, cores e teores alcoólicos.
Alguns desses rótulos já foram premiados internacionalmente, 2016, no Bier Hub no World e em 2023 no Beer Awards (WBA), um dos mais prestigiados concursos de cerveja do mundo. A cerveja ‘MinduIPA’, com 500 ml e produzida com cinco diferentes tipos de lúpulo, ganhou em 2023 a medalha de ouro no WBA..
Em premiações nacionais, a cerveja ‘Biomas’, com sabor e aroma da mangaba, pitaya, mel e pimenta, conquistou a medalha de ouro na Copa Cerveja Brasil 2023. A ‘Cumaris’, com o café da variedade Catuaí Amarelo, do sul de Minas, o cacau de Ilhéus, o côco e o cumaru da Amazônia, conquistou a medalha de prata no Brasil Beer Cup 2022 e, por fim, o rótulo ‘Eu vim da Bahia’, com jenipapo em sua composição, adquiriu a medalha de bronze na Copa Cerveja Brasil 2023.
Sertão também produz cerveja artesanal com ingredientes da Caatinga
A Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc), surgiu em 2004, quando mulheres e homens agricultores familiares de três municípios do Sertão baiano se juntaram e organizaram para produzir e comercializar produtos agrícolas. Além das geléias, doces, compotas, sucos e polpas, a cooperativa produz bebidas alcoólicas tendo como insumo principal o umbu e o maracujá do sertão. Todos os produtos são fabricados pela marca Gravetero, pertencente à cooperativa.
Tudo começa na década de 90, quando Emanuel Gonçalves de Almeida, 27 anos, frequenta desde pequeno a cooperativa através de um trabalho comunitário organizado pela Igreja Católica na cidade de Uauá e aprende tudo sobre agricultura familiar através de sua tia, uma das fundadoras da Coopercuc.
Em 2016, aos 20 anos, por meio de um estágio, também na cooperativa, Emanuel foi para Blumenau, em Santa Catarina, para aprender sobre cerveja artesanal. O intuito era desenvolver uma receita original que tivesse o sabor e ingredientes baianos.
“Tive essa oportunidade de aprender como é produzir esse tipo de cerveja, pois a cooperativa já estava pensando em comercializar o produto. Nós desenvolvemos as nossas cervejas que levam as frutas umbu e maracujá do sertão, que configuram notas únicas e frutadas a bebida. Isso é inovador”, diz ele. Além dos ingredientes típicos de uma cerveja, a cooperativa possui três rótulos que levam polpa de umbu em sua composição e mais um rótulo com polpa de maracujá do sertão, tendo como características, uma cerveja clara, amargor moderado com notas cítricas e herbais.
Na visão de Emanuel, degustar uma cerveja artesanal feita de ingredientes da caatinga, é uma experiência que fica marcada na memória. “Não são apenas cervejas artesanais. É uma alquimia perfeita que possibilita unir notas para entregar um produto diferenciado, com um sabor nordestino. A cerveja é mais encorpada, tem mais sabor e ativa o paladar das pessoas”, explica.
As cervejas da Coopercuc têm produção cigana em parceria com Proa Cervejaria, outra empresa baiana que produz cerveja artesanal e fica em Salvador.
As duas cervejarias irão lançar a primeira cerveja artesanal colaborativa da agricultura familiar da Bahia. A cerveja ‘Sertão ao Litoral’ combina notas de goiaba, a acidez do maracujá da caatinga com o toque floral do hibisco, planta utilizada em fins alimentícios e terapêuticos.
Todos os produtos desenvolvidos pela Coopercuc são produzidos de maneira sustentável, sem desmatamento e adotando uma gestão racional da água, especialmente através do método de irrigação por gotejamento (método de irrigação no qual a água é liberada lentamente, gotejando diretamente sobre o solo próximo às plantas).
Cerveja em parceria com a Ambev e produção de cachaça
A Cooperativa também lançou a primeira cerveja artesanal produzida pela agricultura familiar baiana em parceria com a AmBev, empresa brasileira líder em produção de bebida. O primeiro lote já foi produzido e a essa parceria tem como objetivo agregar mais valor ao produto. “Queremos aprimorar nosso processo de produção e levar nossa cerveja saison com umbu para todo o Brasil. Além disso, queremos oferecer um preço mais acessível ao público, tornando a cerveja artesanal uma opção para todos”, diz o texto de apresentação da bebida no perfil da cervejaria no Instagram.
A apresentação oficial da bebida aconteceu na 14ª Feira Baiana da Agricultura Familiar e Economia Solidária, que é realizada de 13 a 17 de dezembro no Parque Costa Azul localizado na orla de Salvador.
E, para aqueles que não gostam de cerveja, há o licor e a cachaça produzida pela cooperativa feita também de umbu. Todas as bebidas estão disponíveis para a venda no site https://coopercuc.com.br/. Além da terra do dendê, a Bahia também é a terra da cerveja artesanal produzida com qualidade.