Edital vai remunerar artistas para repensar o Brasil a partir de ideias criadas por figuras históricas como Maria Amanda Paranaguá, André Rebouças e José do Patrocínio
Idealizada pela diretora e produtora executiva Mariana Luiza (“Redenção”), em colaboração com as professoras Ana Flávia Magalhães Pinto (História-UnB e Arquivo Nacional) e Thula Pires (Direito-PUC-Rio), a exposição “Constituinte do Brasil Possível” é uma ação cultural que propõe uma reimaginação histórica na qual a população negra brasileira, em oposição ao curso da História Oficial, participaria ativamente dos debates parlamentares do país desde a abolição da escravidão em 13 de maio de 1888. Por meio de um edital de convocação pública, serão selecionadas 10 propostas artísticas inéditas, de pessoas com idade a partir de 18 anos, autodeclaradas pretas ou pardas.
Artistas de todo o Brasil, com trajetórias mais consolidadas ou estreantes, podem se inscrever. Cada artista selecionado vai receber R$4.500,00 para executar sua obra, que tem previsão de ser exibida no Centro Cultural dos Correios do Rio de Janeiro em outubro deste ano. As inscrições são gratuitas e devem ser realizadas através deste formulário on-line até o dia 26 de junho de 2024, às 23h59. O resultado será divulgado no site www.linhadecor.com e nas redes sociais do projeto no dia 15 de julho de 2024.
No mesmo formulário, os interessados devem enviar um vídeo de um a quatro minutos que responda à pergunta “Como sua obra pode contribuir para o imaginário de um Brasil possível?” junto com um portfólio e uma proposta artística, que podem ser entregues no formato PDF ou vídeo/animação. Todos os detalhes, exigências e demais etapas estão no edital, que está disponível no site Linha de Cor.
As propostas artísticas devem conter uma descrição minuciosa sobre a linguagem que o candidato pretende adotar. Entre as linguagens estão: pintura (em variados materiais), escultura, impressão 3d, gravura, fotografia, indumentária, artesanato, arte gráfica, xilogravura, poesia visual, arte postal, zine, performance, grafite, lambe-lambe, stencil, colagem, fotoperformance, artes integradas e outras não especificadas anteriormente.
“A exposição propõe um exercício de imaginação histórica para o Brasil que se firmava enquanto nação no século XIX. Convocamos artistas negros (pretos e pardos) a imaginarem projetos para o Brasil a partir de personagens negros invisibilizados pela História oficial. E se no dia seguinte a abolição da escravidão, uma nova Constituinte fosse convocada para o Brasil com a participação ativa de pessoas negras? Partimos de uma Constituinte afro-brasileira desejando inspirar fabulações históricas de todos os excluídos deste projeto de nação branco, patriarcal e eurocêntrico que se construiu e ainda está em curso no Brasil”, explica Mariana.
Quatorze de Maio de 1888
Com curadoria coletiva composta por Yago Lima, arquivista e consultor em Museologia, em conjunto com Mariana, Ana Flávia e Thula, a exposição “Constituinte do Brasil Possível” propõe um exercício imagético em que uma Constituição fabulada reuniria artistas do presente com personagens históricos negros do século XIX. O objetivo é criar um debate sobre propostas de um Brasil possível, em que pretos e pardos, a maioria da população, são vistos como sujeitos decisivos nos debates e encaminhamentos de projetos políticos, sociais e culturais do país. A data chave para o projeto é o dia 14 de maio de 1888, um dia após a abolição da escravatura, em que pessoas negras continuaram a ser marginalizadas pela sociedade.
“No 14 de maio fabulado por nosso time de historiadores, pretendemos discutir um atraso de 66 anos que separa a afirmação da independência e uma não participação equitativa da população negra e indígena na sociedade. Personagens que atuaram na sociedade civil e na política poderão se fazer presentes na Constituinte como alguém que deixou um legado. São alguns deles: Maria Amanda Paranaguá, Tia Ciata, André Rebouças, José do Patrocínio, Machado de Assis, entre outros”, explica a professora de História da UnB, Ana Flávia Magalhães Pinto.
A exposição “Constituinte do Brasil Possível” é integrante do Projeto Linha de Cor, uma iniciativa inédita que envolve pesquisa, educação e audiovisual realizados por pessoas negras. Ela foi contemplada pelo Edital Pró-Carioca Diversidade Cultural – Edição Paulo Gustavo – SMC nº 04/2023, da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (PCRJ), por intermédio da Secretaria Municipal de Cultura (SMC).
MARIANA LUIZA | Idealizadora, Curadora e Produtora Executiva
Mariana Luiza é uma mulher negra, uma contadora de histórias. O seu trabalho como roteirista e realizadora tem sido reconhecido em festivais de cinema nacionais e internacionais, onde explora temas relacionados com a identidade negra, pertença e gênero.
Mariana é idealizadora e criadora do projeto Linha de Cor, projeto transmídia que investiga o papel do Estado na estruturação do racismo no Brasil. O projeto é composto por uma pesquisa de leis e projetos de leis que marginalizaram o povo negro no Brasil, e as ações de resistência de pessoas pretas a estas leis. A pesquisa resulta na exposição Constituinte do Brasil Possível, no website Linha de Cor e no longa-metragem documental A Cor da Margem (em desenvolvimento).
Em 2023, realizou a instalação imersiva “Redenção”, que foi selecionada para a competição imersiva de não ficção no International Documentary Film Festival Amsterdam, o IDFA-Doclab.
Em 2021, dirigiu dois episódios da série de streaming “Enigma da ‘Energia Escura'” (26 min) produzida pelo Lab Fantasma e GNT. Em 2017, Mariana dirigiu o curta-metragem de ficção “Casca de Baobá” (12 min), que foi exibido em diversas mostras e festivais no Brasil e em países como Canadá, Estados Unidos, França, Portugal, Coreia do Sul, Colômbia, Cabo Verde, entre outros, tendo recebido seis prêmios. Em 2010, dirigiu o documentário “A B Ser” (52 min), que ganhou o prêmio Filma Brasil da TV Futura. Como roteirista, Mariana já colaborou com produtoras como Preta Portê Filmes, Conspiração Filmes e Coqueirão Pictures. Co-roteirizou o filme “Praia Formosa” (2024, IFF Rotterdam), dirigido por Julia De Simone, e contribuiu para “A Festa de Leo” (2023, Festival do Rio), dirigido por Gustavo Melo e Luciana Bezerra. Mariana é formada em roteiro pela New York Film Academy e em montagem pela Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Rio de Janeiro. É membro ativo da Associação dos Produtores Audiovisuais Negros (APAN), Brown Girl DOC Mafia (BGDM), African American Women In Cinema (AAWIC) e Talento Paradiso.
ANA FLÁVIA MAGALHÃES | Coordenadora da Pesquisa e Curadora
Doutora em História pela Unicamp (2014), mestre em História pela UnB (2006); bacharel em Jornalismo pelo UniCeub (2001); e licenciada em História pela Unip (2017). É professora adjunta do Departamento de História da UnB. Atua no Programas de Pós-Graduação em História (PPGHIS) e Direitos Humanos (PPGDH) também da UnB. Desde a primeira graduação, desenvolve pesquisas articulando conhecimentos das áreas de História, Comunicação, Literatura e Educação, com ênfase em: atuação político-cultural de pensadores(as) negros(as), imprensa negra, abolicionismos e experiências de liberdade e cidadania negras no período escravista e no pós-abolição no Brasil e em outros pontos da Diáspora Africana; sempre atenta ao Ensino de História. É atualmente coordenadora da Regional Centro-Oeste do GT Emancipações e Pós-Abolição da Anpuh (2019-2021) e integrante da Rede de Historiadoras Negras e Historiadores Negros (RHN). Atualmente é diretora do Arquivo Nacional.
THULA PIRES | Coordenadora da Pesquisa e Curadora
Doutora (2013) e mestre (2004) em Direito Constitucional e Teoria do Estado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Graduada em Direito pela mesma universidade em 2002. Atualmente é professora nos cursos de graduação e pós-graduação do Departamento de Direito da PUC-Rio, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Direito e coordenadora-geral do Núcleo Interdisciplinar de Reflexão e Memória Afrodescendente (Nirema). Professora Visitante Jr. no African Gender Institute, University of Cape Town (CAPES/Print/2020). Jovem Cientista do Nosso Estado (FAPERJ, 2022/2025). Integrante do Conselho do Instituto Clima e Sociedade (ICS), da Assembleia Geral da Anistia Internacional no Brasil e associada de Criola.
Mãe da Dandara e bailarina. Tem experiência na área de Direito Constitucional, atuando principalmente com os seguintes temas: pensamento afrodiaspórico, racismo, mulheres negras, decolonialidade, teoria crítica da raça, direitos humanos e teoria do reconhecimento.
YAGO LIMA | Curador
Produtor e curador independente, atua nas áreas de elaboração, gestão e produção de projetos artístico-culturais. É graduado em Arquivologia pela UFBA, com mestrado em Museologia e Patrimônio pela UniRio/Mast. Atualmente, é discente do curso de Produção em Comunicação e Cultura na UFBA. Também trabalha como arquivista no Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, consultor em Museologia no Museu da Fazenda Federal no Rio de Janeiro e produtor executivo e brincante da Quadrilha Junina Show em Anguera/BA.