Com o aumento sobre produtos importados, consumidores migram para plataformas de revenda e brechós, impulsionando o mercado de moda circular, segundo especialista
A economia circular já não é mais uma tendência, é uma exigência urgente para o varejo de moda. Impulsionado por mudanças no comportamento do consumidor e por novas tarifas impostas sobre produtos importados por governos como o dos Estados Unidos – que tornam as roupas novas significativamente mais caras, chegando a até 25% sobre itens de vestuário provenientes da China -, o mercado de second hand e upcycling vive um dos seus momentos mais importantes e decisivos no Brasil e no mundo. Eventos com a ThriftCon, feiras de roupas vintage, já movimentam dezenas de milhares de pessoas por edição, refletindo o crescimento de um setor que deve ultrapassar US$350 bilhões globalmente até 2027, segundo o BOF Insights.
Esse movimento também é fortemente impulsionado por políticas públicas e marcos regulatórios. O “Plano Nacional de Economia Circular 2025-2034”, lançado pela ENEC (Estratégia Nacional de Economia Circular), reconhece a indústria da moda como um dos setores estratégicos para a transição circular no Brasil. O documento propõe diretrizes para a redução de resíduos têxteis, reutilização de materiais, extensão do ciclo de vida das peças e inovação em modelos de negócios circulares, como revendas, aluguel de roupas e compartilhamento. A proposta é integrar práticas circulares em toda a cadeia produtiva, desde o design até o pós-consumo, promovendo também a rastreabilidade e o uso de materiais de menor impacto ambiental.
O cenário geopolítico recente, somado à crescente preocupação ambiental, vem reposicionando o consumo, onde peças com história, circularidade e propósito estão cada vez mais valorizadas. “O consumidor atual não quer apenas consumir. Ele quer significado, responsabilidade e pertencimento. A moda de segunda mão oferece tudo isso, com um toque de exclusividade”, afirma Daniela Dornellas, especialista em varejo e idealizadora e curadora do Fashion Meeting, plataforma pioneira no Brasil focada em promover eventos voltados ao empreendedorismo no mercado de moda.
Segundo dados recentes divulgados por publicações como o The Economist e o BOF (Business of Fashion), o mercado global de roupas usadas está crescendo a taxas superiores às do varejo tradicional, impulsionado por fatores econômicos e regulatórios. Em especial, o aumento de tarifas sobre produtos importados e a fiscalização mais rígida sobre marketplaces de fast fashion, como Shein e Temu, estão redirecionando o consumo para plataformas de revenda e iniciativas circulares.
Marcas de peso já reagiram a esse cenário, como a Zara, que lançou a plataforma “Pre-Owned”, permitindo aos clientes consertar, revender ou doar suas peças usadas. O serviço já está ativo em mais de 15 países e tem previsão de expansão global até o fim do ano. Já a Miu Miu, marca de luxo italiana, aposta em coleções de upcycling, transformando peças vintage em criações de alto valor artístico e comercial. No Brasil, Daniela destaca parcerias do Fashion Meeting, como a realizada com o brechó Capricho à Toa, que uniu criativos da moda para repensar descartes como matéria-prima para peças novas e exclusivas. “Essas colaborações mostram como é possível aliar estética, propósito e inovação. A moda não precisa ser descartável, ela pode e deve ser um agente de mudança”, reforça.
O movimento de transformação é também uma resposta à pressão por práticas ESG, que vêm pautando as decisões de investimento e consumo no setor. Para Dornellas, a economia circular não deve ser vista como nicho, mas como parte da engrenagem principal da moda do futuro. “A revenda, o upcycling e a longevidade das peças não são uma moda passageira, mas o novo normal do varejo responsável”, conclui.